Construção e desafios do Fórum da Agenda 21 Local em Saquarema
Resumo
O município de Saquarema está situado na Bacia Hidrográfica Lagos São João, na Região Leste do Estado do Rio de Janeiro, conhecida também como Região dos Lagos. A cidade apresenta atrações turísticas ligadas às belezas naturais, característica de regiões litorâneas. Com ondas perfeitas para a prática de surfe, o município conquistou o título de "Capital nacional do surfe", mas também apresenta força turística para outras atividades esportivas e pela cultura local, ressaltando dentre as tradicionais festas religiosas, o "Círio de Nazareth", o mais antigo do Brasil.
No nível social, o município de Saquarema é considerado de pequeno porte, com cerca de 75 mil habitantes, na maioria de baixa renda e baixa escolaridade, onde só recentemente se iniciou um processo lento de industrialização no Pólo Industrial de Sampaio Corrêa, um distrito de características rurais que hoje vive intensas mudanças, com o surgimento de indústrias e condomínios residenciais.
Os impactos deste crescimento já aparecem também no nível econômico e ambiental, pois se surgem mais empregos, por outro lado falta infraestrutura urbana, rede de esgoto e se observa o assoreamento dos rios, ocupação desordenada do solo, etc..
O Rio Rural, programa estadual com apoio do governo federal e recursos do Banco Mundial, se estabeleceu há poucos anos em Sampaio Corrêa. O programa é da Secretaria Estadual de Agricultura e Pecuária, que atua de forma participativa e com governança compartilhada, através de um Conselho Gestor, que preconiza o desenvolvimento sustentável voltado para a população local: agricultores, pescadores, donos de pousadas, desportistas praticantes de esportes radicais como o voo livre, comerciantes locais e agora também os industriais.
Situado na microbacia do Rio Roncador, o programa vem empreendendo algumas ações como a preservação da nascente do rio, a criação de um horto municipal de criação de mudas da Mata Atlântica, a distribuição de redes para os pescadores, entre outras atividades. No município, o programa atua em parceria com a Secretaria Municipal de Agricultura, Abastecimento e Pesca, com a Emater-RJ, associações de moradores e agricultores, Sindicato Rural, Colônia de Pescadores Z-24 e com o Comitê da Bacia Hidrográfica Lagos São João, que destinou um pequeno recurso para a construção do horto comunitário, visando o reflorestamento e a recuperação da mata ciliar.
Apresentacão do projeto
O processo de criação da Agenda 21 em Saquarema se iniciou nos anos 90, após a publicação de uma pequena cartilha distribuída pela FAMERJ (Federação das Associações de Moradores do Estado do Rio de Janeiro) junto às Federações Municipais e às Associações de Moradores. Em Saquarema já existia na época uma Federação das Associações de Moradores e Amigos muito atuante, a FAMOSA, fundada pelo sindicalista e líder comunitário Edimilson Soares, que se mudou do Rio de Janeiro para Saquarema. Fundador de várias associações de moradores no município, entre elas a Associação de Moradores e Amigos de Barra Nova, onde morava e vive até hoje, Edimilson e sua companheira, a jornalista Dulce Tupy, na época exercendo a função de secretária geral da FAMOSA, resolveram divulgar na cidade a importância da Agenda 21 para o desenvolvimento sustentável, promovendo na Câmara Municipal um debate que lotou o primeiro andar e a galeria do Legislativo saquaremense, com a presença também de vereadores que criaram uma Comissão Parlamentar do Meio Ambiente que existe até hoje.
Esta comissão delineou a primeira lei da Agenda 21 Local, que, no entanto não foi votada devido à substituição do então prefeito Carlos Campos, por motivo de saúde. Junto com lideranças comunitárias de Saquarema, esta Comissão Parlamentar participou de uma reunião na sede da FAMERJ, no Rio, com a então Secretária Nacional do Meio Ambiente, Aspásia Camargo, numa época em que não havia ainda o Ministério do Meio Ambiente. Também em Saquarema, houve a tentativa de construção de um Plano de Desenvolvimento Sustentável Local, que teve pouca repercussão.
Hoje a Agenda 21 se constituiu num Fórum que reúne não só associações de moradores, mas também os demais segmentos sociais. Assim, o Fórum da Agenda 21 Saquarema reúne os quatro setores da sociedade. O primeiro setor é constituído por representantes do Poder Público; o segundo setor é constituído por representantes do Setor Empresarial, empresários da cidade, geralmente pequenos empresários. O terceiro setor é constituído por representantes de ONGs - Organizações Não Governamentais, que atuam no município, entre elas associações de mulheres como a AMEAS - Associação de Mulheres Empreendedoras Acontecendo em Saquarema; associações de caráter assistencial como a Renascer Obras Sociais, Igreja Católica - Paróquia de Nossa Senhora de Nazareth, Poabas - ONG ambientalista e outras.
O quarto setor é ocupado por representantes da comunidade. O Setor Comunitário reúne associações de moradores, a Colônia de Pescadores Z-24, a Aprosa - Associação de Pequenos Agricultores de Saquarema, a Cobepps - Cooperativa de Beneficiamento da Pesca e dos Pescadores de Saquarema e outras. Esta formatação acompanhou a proposta formulada pela Agenda 21 Comperj, da Petrobras, que gerou a consolidação das Agendas 21 Locais em 14 municípios que fazem parte da área de influência do Comperj - Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro, maior empreendimento petroquímico do Brasil e América Latina, que está sendo construído no município de Itaboraí.
Saquarema está situada neste entorno e participou ativamente da reconstrução de sua própria Agenda 21, realizando o seu PLDS - Plano Local de Desenvolvimento Sustentável, de forma participativa, publicado pela Petrobras e lançado na cidade com grande divulgação num evento marcante para a vida social e cultural do município, na principal Casa de Festas da cidade. Desde o início desta segunda fase da Agenda 21 Saquarema, integrada à Agenda 21 Comperj, o Fórum da Agenda 21 Local é gerido por quatro coordenadores, de forma colegiada, sendo um de cada setor: Setor Público, Empresarial, ONG e Comunidade.
O Fórum da Agenda 21 Saquarema não tem financiamento oficial, contando apenas com o trabalho voluntário de seus membros e a ajuda do comércio local, por ocasião dos eventos. Mas está no PLDS a necessidade de criação de um Fundo da Agenda 21, que ainda não está sistematizado, e a urgência de uma sede para as reuniões, para a secretaria, a guarda das atas e constituição de uma pequena biblioteca.
Motivações
As motivações sempre foram o desejo de implantar no município, com seus inúmeros recursos naturais, o desenvolvimento sustentável, numa cidade que já foi considerada a Capital do Surfe, pela qualidade de suas ondas perfeitas para a prática do esporte, principalmente na Praia de Itaúna. O município abriga ainda uma das pistas de voo livre mais perfeitas do Estado do Rio de Janeiro e o Centro de Desenvolvimento do Voleibol, que é uma referência no mundo inteiro. Com esta vocação esportiva e turística, Saquarema também tem espaço para o turismo ambiental, com praias paradisíacas, serras e cachoeiras. Mas falta consciência ambiental tanto entre os moradores como entre os turistas, que muitas vezes não cuidam da cidade como deveriam, evitando jogar lixo nas ruas, por exemplo. Também falta a iniciativa do Poder Público, para tomar providências e realizar campanhas de conscientização neste sentido.
O lançamento da Agenda 21 na Câmara Municipal de Saquarema, nos anos 1997, foi o primeiro evento, que repercutiu bastante entre as autoridades, prefeito e vereadores, além da sociedade em geral. Depois, houve outras tentativas que não deram certo, como por exemplo o da Comunidade Ativa, do governo federal, empreendido pela primeira dama Ruth Cardoso, até a chegada da Caravana Petrobras em 2009 que, com o apoio da divulgação do jornal O Saquá, editado pela Tupy Comunicações, mobilizou a cidade.
Na ocasião realizou-se um grande evento, para lançar a ideia de construção da Agenda 21 Comperj, numa das maiores casas de festa da cidade, a Cinea Fest House, no bairro Porto Novo, que reuniu centenas de pessoas e se encerrou com um grandioso coquetel oferecido pela Petrobras, maior empresa do país. A partir daí, os quatro setores passaram a se reunir em separado, mobilizando a sociedade local, sempre com o apoio da divulgação de pelo menos um jornal, mas também com repercussão nos discursos dos vereadores na Câmara Municipal. Tanto é assim que, em pouco tempo, foi apresentado o primeiro Projeto de Lei da Agenda 21, feito às pressas na Câmara e que não contemplava a paridade entre os setores e que posteriormente teve que ser refeito.
Inicialmente só se pensava em termos de meio ambiente. Estas eram as diretrizes advindas com as cartilhas da FAMERJ. Mas com a participação da Petrobras neste processo e com o amadurecimento em geral da Agenda 21 em todo o Brasil, no movimento das mulheres e em outros setores, os objetivos ultrapassaram a questão ambiental e se voltou para o conjunto da sociedade. Um dos fatores determinantes neste processo foi a construção do Plano Diretor Participativo de Saquarema, que, no entanto, nunca foi publicado e tem sido pouquíssimo divulgado, discutido e praticado.
Estrutura e Organizacão
Desde a sua fundação, o Fórum da Agenda 21 Local, vinculado à Agenda 21 Comperj, é composto de seis membros de cada um dos quatro setores (Público, Empresarial, ONG e Comunitário), sendo cinco titulares e um suplente em cada setor. A liderança é compartilhada entre os quatro coordenadores, com destaque para duas pessoas que, além de acompanharem o processo desde o início, têm representado o Fórum da Agenda 21 Local em outros espaços institucionais que são a jornalista Dulce Tupy, uma ambientalista histórica, que inclusive participou da célebre Rio-92, e a pedagoga Layla Garrido, que participou de todas as reuniões preparatórias desta segunda fase da Agenda 21 Saquarema, tendo sido eleita uma das coordenadoras da Agenda 21 Comperj, função que se extinguiu, mais tarde, ficando a organização do Comperj sendo articulada por uma empresa de consultoria.
Atualmente, foi criado o ComARC, Comitê das Agendas 21 da Região do Comperj, tendo a jornalista Dulce Tupy sido eleita como suplente do Leandro, representante de Teresópolis, no Fórum Comperj, que reúne várias instituições no Rio de Janeiro, entre elas a Firjan, a Fecomércio, o Conleste - Consórcio dos Municípios do Leste Fluminense - e o governo do Estado do Rio de Janeiro, cujo governador Sérgio Cabral foi seu primeiro presidente. Cabe dizer que Dulce e Layla foram convidadas e deram depoimentos sobre a Agenda 21 para o Projeto Memória Petrobras em parceria com o Museu da Pessoa, de São Paulo, indicadas pela Agenda 21 Comperj, assim como também participaram em Fortaleza, no Ceará, do Fórum das Agendas 21 Locais, com representantes de todo o país.
O Fórum da A-21 Saquarema possui um calendário de reuniões, uma vez por mês. Mas, devido à falta de uma sede, muitas vezes o local e o horário foram alterados, prejudicando a sequência das reuniões. As reuniões se realizaram no Centro Paroquial Santo Antônio, no Centro Social Madre Maria das Neves, na Colônia de Pescadores Z-24, na sede da OAB - Ordem dos Advogados do Brasil, seção Saquarema, na AMEAS - Associação de Mulheres Empreendedoras Acontecendo em Saquarema e atualmente se reúne no sede do Mamas - Movimento Articulado de Mulheres e Amigas de Saquarema.
Inicialmente, os membros da Agenda 21 foram escolhidos por consenso nas reuniões setoriais, que constituíram o Fórum. Depois de consolidado e promulgado em lei, o Fórum da Agenda 21 Saquarema foi sendo renovado naturalmente, através de novos contatos, indicações e convites para participar das reuniões que continuam abertas ao público em geral. Os representantes são voluntários e, portanto, estão sujeitos a participar ou não das reuniões, de acordo com o tempo disponível de cada um. Assim, há momentos em que alguns representantes se afastam, por motivos pessoais, de trabalho ou de saúde, e retornam às atividades ou não. É o caso, por exemplo, da Cooperativa de Pesca e Pescadores, que se retirou enquanto estava paralisada e retomou recentemente suas atividades, mas ainda não retornou de fato ao Fórum da Agenda 21 Local. É o caso também dos empresários que na maioria acabaram se afastando do Fórum.
O Fórum da Agenda 21 Saquarema tem recebido apoio técnico e recursos humanos através do Comperj, pela consultoria do Projeto Agenda 21 Comperj. O governo do Estado já deu mais suporte anteriormente, mas agora vem retornando com o apoio, por exemplo, na construção das demais Agendas 21 na Bacia Hidrográfica Lagos São João. O Núcleo Especial da Agenda 21 do INEA (Instituto Estadual do Ambiente), vinculado à SEA (Secretaria Estadual do Ambiente) do governo do Estado, em parceria com a Agenda 21 Comperj também articulou o assento para as Agendas 21 Locais no Fórum Comperj, quando foram eleitos dois representantes dos 14 municípios: Teresópolis (titular) e Saquarema (suplente). Posteriormente esses representantes foram substituídos por outros representantes no âmbito do ComArc, um Fórum que reúne dois representantes de cada um dos 14 municípios do entorno do Comperj, além da articulação com o Conleste e outras instâncias de participação governamental.
Em Saquarema, os vínculos com o governo local são fracos, mas com a sociedade civil há boa integração, principalmente com o reconhecimento das atividades do Fórum da Agenda 21 Local. No entanto, a relação com o governo municipal vem se consolidando lentamente, tendo se realizado uma importante reunião sobre a A3P (Agenda Ambiental da Administração Pública), uma agenda de gestão sustentável voltada especificamente para o setor público, no auditório da Faetec, Fundação de Apoio ao Ensino Técnico. A reunião mobilizou vários representantes do Executivo e do Legislativo de Saquarema, no início de 2012, levando a ideia de um trabalho integrado entre Poder Público e Sociedade Civil, para atingir os objetivos da Agenda 21.
Outra iniciativa foi o Seminário Transparência e Controle Social, realizado na sede do CACS, Círculo Artístico e Cultural de Saquarema, com a participação de representantes dos diversos Conselhos Municipais de Educação, Saúde, Criança e Adolescente e outros, além de membros da sociedade civil, como OAB, Ordem dos Advogados do Brasil e presença de um vereador. Outro evento memorável na trajetória do Fórum da Agenda 21 Local foi o Seminário sobre Resíduos Sólidos, realizada na Câmara Municipal de Saquarema, que trouxe especialistas no tema para um debate público que lotou o plenário.
Para falar de patrocínio local, há que se referir aos jornais, sites e redes sociais que vêm divulgando o Fórum da Agenda 21 Saquarema e a Agenda 21 Comperj, em suas páginas, sem custo, ao longo dos anos, entre outros colaboradores locais. Esta mídia alternativa, principalmente o jornal O Saquá, tem mantido a divulgação do tema e o entusiasmo das pessoas envolvidas neste processo.
Apesar do apoio do governo municipal ser mínimo, pelo menos a Câmara Municipal criou a Lei Municipal de criação do Fórum da Agenda 21 Local, depois reformulada, e mantém a Comissão de Meio Ambiente funcionando. A Lei 985 de 29 de abril de 2009 é a Lei que institui o programa da Agenda 21 Local e altera a Lei nº. 904 de 14 de novembro de 2007. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente também vem reforçando seu apoio à Agenda 21, comprovada no ônibus emprestado para a ida de seus representantes à Conferência Regional de Meio Ambiente, realizada em São Pedro da Aldeia. Mas o Conselho Municipal do Meio Ambiente, apesar de ter sido criado e seus membros nomeados, ainda está praticamente paralisado. E também não há nenhum apoio do governo federal, a não ser da própria Petrobras, através do Comperj.
A relação entre as entidades no Fórum da Agenda 21 Local é saudável, principalmente quando há eventos para se realizar e tarefas a cumprir. Mas, devido à falta da prática de discussões, leituras e aprimoramento teórico, algumas vezes as discussões ficam estéreis, sem chegar a lugar nenhum. Talvez fosse necessário um plano de estudos, apresentações de vídeos e outros recursos didáticos para aprofundar o conteúdo das Agendas 21 e do Desenvolvimento Sustentável; sair um pouco do imediatismo e olhar o horizonte mais a longo prazo. Ou seja, há a necessidade de cursos de capacitação permanentemente, pois os membros são renovados e os que chegam ainda não dominam os termos, a conduta e todas as nuances do processo de construção da Agenda 21.
Com os outros coletivos, a relação também nem sempre é muito produtiva, pois o Comitê de Bacia Hidrográfica Lagos São João, por exemplo, não abre espaço para a discussão em torno da Agenda 21 e são poucos os municípios na bacia hidrográfica que têm Fóruns da Agenda 21: Saquarema, Maricá, Rio Bonito, Silva Jardim e Casimiro de Abreu. Araruama só agora está iniciando seu processo de construção de uma Agenda 21 Local. Com o Conselho Gestor da Unidade de Conservação da APA da Massambaba também a relação é frágil, pois raramente se encontram nessas reuniões representantes do governo de Saquarema e da sociedade civil saquaremense, embora as reuniões sejam abertas ao público dos três municípios que fazem parte da APA da Massambaba: Saquarema, Araruama e Arraial do Cabo. Por outro lado, nunca foi criado oficialmente o Conselho do Plano Diretor em Saquarema, que nunca foi impresso e divulgado amplamente.
Comitê de Bacia
O melhor modo de alocar recursos no município dentro da Região Hidrográfica é através da construção de redes de esgotos nos bairros, especialmente no entorno da Lagoa de Saquarema, na Lagoa de Jaconé e Lagoa de Jacarepiá, única lagoa de água doce na região, assim como o aumento das Estações de Tratamento de Esgoto na cidade, nos três distritos. Este é um programa ambicioso, tendo em vista que um Plano de Saneamento Básico foi feito, com apoio da Secretaria Estadual do Ambiente, através do Inea, Instituto Estadual do Ambiente e do Comitê da Bacia Hidrográfica Lagos São João (CBHLSJ), mas não foi implementado. É preciso ainda um programa sistemático de educação ambiental, voltado para o esclarecimento da população, com métodos de educomunicação, de forma compartilhada e participativa.
Uma das situações que exemplificam esses esclarecimentos é que Saquarema já tem o seu PLDS distribuído para praticamente todas as instituições locais e regionais, inclusive para o Comitê de Bacia Hidrográfica Lagos São João. Estimulado pela consultoria da Agenda 21 Comperj, o PLDS foi revisado, embora apressadamente, mas o suficiente para se ter uma visão do que já foi implementado na cidade e se encontra disponível para consulta no site do Fórum da Agenda 21 Comperj. Uma das obras colocadas no PLDS como prioritária foi a construção de um novo hospital, por exemplo, que foi inaugurado em 2014. A inauguração da própria Faetec, Escola Técnica Helber Vignoli Muniz, no bairro da Barreira, no Distrito de Bacaxá, também se inclui entre as obras que foram contempladas.
Desenvolvimento da Iniciativa
Atualmente o PLDS, já revisado, carece de monitoramento e principalmente de comunicação entre os membros da A-21 e para os cidadãos(ãs). A única rádio local não tem informativo, embora esteja previsto na lei que regulamenta as concessões de rádios no Brasil a obrigatoriedade de veiculação de jornais nas rádios. Também não existem rádios comunitárias, o que daria voz à população. Cerca de meia dúzia de jornais circulam pela cidade, sendo o jornal O Saquá o de maior circulação, atingindo 40% da população, segundo pesquisas, ficando o segundo lugar com 4% e os demais com 1% apenas. Com pouca divulgação, quase não existe multiplicação da informação e o resultado é frustrante para os engajados na Agenda 21, cujas atividades estão praticamente restritas ao cronograma da Agenda 21 Comperj.
O processo que contou inicialmente com um diagnóstico participativo, realizado em inúmeras reuniões conduzidas durante o processo de construção do Fórum da Agenda 21 Saquarema e do Fórum da Agenda 21 Comperj, sofreu várias mudanças e adaptações. O diagnóstico efetuado acompanhou a metodologia proposta pela Petrobras, aplicada por consultores contratados pela Petrobras. O chamado Plano Local de Desenvolvimento Sustentável – PLDS e algumas ações que constam no plano foram empreendidas. É um plano de ação que, no momento em que foi lançado, foi questionado pelos representantes do setor agrícola e do setor da saúde, que reclamaram de alguns dados publicados e da falta de informação na elaboração do PLDS, apesar de terem sido consultados.
Nesse processo de construção do PLDS, a população participou de várias reuniões setoriais e, depois de eleitos os representantes dos quatro setores que constituíram o Fórum, as demandas foram encaminhadas nas reuniões de imersão, realizadas durante três dias num hotel em Silva Jardim, por duas vezes, visando a consolidação do diagnóstico e das ações do PLDS. O resultado foi lançado em livro/caderno já citado, com o Plano Local de Desenvolvimento Sustentável, editado pela Petrobras, junto com um vídeo, abordando aspectos da municipalidade e propostas encaminhadas pelos representantes da sociedade e do poder público. Este foi considerado o momento de maior amadurecimento do Fórum da Agenda 21 Local não só em Saquarema, mas em todos os 14 municípios do entorno do Comperj.
Avaliacão e acompanhamento
A Agenda 21 Comperj teve consultorias de ONGs, inicialmente, e depois de empresas especializadas em meio ambiente e desenvolvimento sustentável. As consultoras, Iser, Roda Viva, Asa e Instituto Ipanema, faziam seus relatórios e os representantes do Fórum da Agenda 21 Local participavam das reuniões mensais de coordenadores, onde também apresentavam seus próprios relatórios. O site da Agenda 21 Comperj, elaborado por uma empresa de comunicação, atualiza as informações relativas às 14 Agendas 21 e outras notícias de interesse geral.
O plano de ação, o PLDS, por sua vez, vem sendo inserido nas políticas do município através da ação do Fórum da Agenda 21 Local, em parceria com os Conselhos Municipais de Saúde, Educação e Cultura, Assistência Social, Criança e Adolescente, Agricultura e Pesca, Segurança Pública e outros. O Fórum da Agenda 21 Local também promoveu uma série de eventos em Saquarema, tendo como destaque o Seminário sobre Resíduos Sólidos, já citado, e no ano seguinte os Estudos Sustentáveis, ambos na Câmara Municipal. Realizou também várias comemorações de datas festivas (Dia da Árvore, Dia da Água, Dia da Limpeza das Praias, etc.), o próprio lançamento do PLDS, a confecção de “tapetes de sal” que são uma tradição religiosa na cidade e dão visibilidade à Agenda 21, na festa de Corpus Christi, de caráter mais popular do que religioso; capacitações, como a realizada no Instituto Madre Maria das Neves, com duração de 2 dias, que se encerrou com uma apresentação do Instituto Ipanema e GWA sobre “Gênero e Água”, e outras iniciativas. Em 2013, o Fórum de Saquarema comemorou o Dia do Meio Ambiente com a apresentação da Agenda 21 na Câmara Municipal, ocupando a Tribuna Livre, por 15 minutos.
Lições aprendidas e desafios
A maior lição que ficou de toda essa experiência realizada é a consciência de que o desenvolvimento pode e deve ser sustentável. O debate, por exemplo, que está na boca do povo sobre o lixão, o destino do lixo hospitalar, o direito a um transporte público de qualidade, a necessidade de preservação do meio ambiente, a pesca e a agricultura equilibrada e outras questões revelam o amadurecimento da população local. A principal lição aprendida para o desenvolvimento de comunidades sustentáveis é atuar em grupo, privilegiando sempre o coletivo em vez do individual, buscando as decisões em consenso, sem perder de foco o desenvolvimento sustentável. Mas fica o desafio para os próximos anos: consolidar o Fórum da Agenda 21 Local, conquistar uma sede e garantir a execução das ações contidas no PLDS. Há uma grande chance de se concretizar esse plano, que só depende da consolidação do Fórum e da mobilização social.
É o caso, por exemplo, do Plano Municipal de Saneamento Básico, já concluído, mas seus objetivos não foram contemplados e até o projeto de construção de um Aterro Sanitário acabou sendo desativado. Foi planejado, mas não executado até hoje, um Seminário sobre Água e Saneamento. E a própria Lei da Agenda 21 foi modificada pela Câmara, recentemente, reduzindo ainda mais a participação popular, retirando o caráter democrático que havia na coordenação colegiada, com quatro coordenadores, um de cada setor, em vez de um. Assim, com este retrocesso, ficou mais difícil alcançar os objetivos da Agenda 21. Principalmente agora que o processo de industrialização está chegando no município, seja através das indústrias que estão sendo inauguradas no Pólo Industrial de Sampaio Corrêa, seja pela notícias de que um grande porto será construído na praia de Jaconé, no Costão de Ponta Negra, no limite dos municípios de Maricá e Saquarema. Este complexo portuário chamado Terminais Ponta Negra (TPN) vai modificar a vida dos cidadãos(as) locais.
Uma Audiência Pública acaba de ser realizar em dias separados nos dois municípios, com grande participação da sociedade. Porém, com uma linguagem muitas vezes hermética para os leigos, as apresentações foram pouco esclarecedoras para a maioria dos participantes que buscavam informações variadas sobre o Porto de Jaconé. Alguns estavam organizados no movimento SOS Porto Não. Mas se esboçou também um movimento Porto Imediatamente, numa clara oposição entre ambientalistas e desenvolvimentistas.
O local previsto para ser instalado o Porto de Jaconé é um paraíso ecológico, onde se encontram também as famosas "beachrocks", descritas pioneiramente pelo naturalista inglês Charles Darwin, pai da Teoria da Evolução, em 1882, baseado em sua passagem pelo Brasil, em 1822. Trata-se de uma área, verdadeiro sítio ecológico e arqueológico, que já está inserido no Geoparque Costões e Lagunas que vem sendo empreendido pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) em parceria com o Conselho Britânico e a Unesco (ONU) e que se estende de Maricá a Campos, no Norte Fluminense. Território abrangente e de relevante interesse geológico, o Geoparque Costões e Lagunas será impactado diretamente pela construção do porto.
O que será, que será? É a pergunta que fica para os saquaremenses que habitam uma das regiões mais cobiçadas no Rio de Janeiro. Para a Petrobras, o espaço é um território privilegiado tanto para importações como exportações de produtos, principalmente vinculados ao escoamento da produção do pré-sal, em poços justamente em frente a esta parte do litoral fluminense. As recentes descobertas dos campos do pré-sal da Bacia de Santos apontam para mudanças praticamente irreversíveis nesta região de Saquarema e Maricá.
Por outro lado, o Comitê da Bacia Hidrográfica Lagos São João não tem capacidade para aprofundar as discussões necessárias sobre este assunto e implementar as ações efetivas para uma negociação entre as partes: de um lado os ambientalistas e de outro os desenvolvimentistas. É um futuro que se desenha sem que haja o mínimo controle por parte da população que se vê refém de projetos mirabolantes que não alcança. É o caso por exemplo na notícia dada com estardalhaço de que o bairro de Jaconé seria contemplado por uma rede de água, que nunca foi implantada efetivamente pela Cedae, Companhia de Águas e Esgotos do Estado do Rio de Janeiro. Sem que ninguém fosse notificado, as obras pararam, as máquinas foram removidas, sem explicação para o fato. Enquanto isso, o Rio Roncador, que fica na Serra do Matogrosso, de onde viria a água para o abastecimento do bairro, está secando, no contexto da atual crise hídrica, alavancada ainda mais pela exploração desenfreada dos campos de plantio de grama, sem o devido monitoramento do Comitê da Bacia. Para onde vamos?
Novos caminhos
Atualmente, com o Fórum Local da Agenda 21 enfraquecido e desmobilizado, muitos integrantes vêm se reunindo nos encontros do INCID - Indicadores da Cidadania, que atua no monitoramento de 14 municípios da Região Leste Fluminense, incluindo Saquarema, como uma ferramenta diagnóstico, garantia e ampliação dos direitos de cidadania, no entorno do Comperj. Com apoio da própria Petrobras, o projeto feito pelo Ibase, Instituto Betinho, tem conquistado adeptos e está em fase de criação de um mapa da cultura de Saquarema, de forma participativa, cujas reuniões tem sido no Centro Social Madre Maria das Neves, uma das ONGs mais antigas do município, situada num prédio histórico, onde funcionou a primeira maternidade, no final do século 19.
Em 2014, o Ibase promoveu no Rio uma Conferência com a participação de dezenas representantes dos quatorze municípios do entorno do Comperj, para fazer um balanço das atividades realizadas ao longo dos dois últimos anos. Assim, aos poucos, com idas e vindas, o Fórum da Agenda 21 Saquarema vem se articulando com iniciativas como esta do Incid e com o Comitê de Bacia Hidrográfica Lagos São João, especialmente através do Subcomitê da Lagoa de Saquarema, Jaconé e Jacarepiá. É mais uma tentativa de não deixar esmorecer tudo que já foi conquistado até hoje, no sentido do desenvolvimento sustentável que tanto almejamos.
Como citar este texto?
TUPY, D. (2015) « Construção e desafios do Fórum da Agenda 21 Local em Saquarema ». Dans GAGNON, C. (Éd), Guide québécois pour des Agendas 21e siècle locaux : applications territoriales de développement durable viable, [En ligne] http://demarchesterritorialesdedeveloppementdurable.org/saquarema-brasil/ (consultados dia, mês, ano).
Dernière modification: 3 juin 2015